Uma breve passagem por Nova York foi suficiente para carregar minhas energias e então era chegada a hora de me aventurar pelo Canadá. Depois de uma passagem rápida pela imigração e pelo controle de bagagens lá estava eu esperando o ônibus para chegar ao centro de Ottawa para hospedar-me na famosa prisão Hostel Jail, um albergue da juventude que no passado abrigou a cadeia pública da cidade e hoje oferece confortáveis acomodações em autênticas celas que conservam sua arquitetura original colonial, além de um calabouço bar com opções de coquetéis e um passeio guiado para conhecer a história do prédio. O albergue fica muito bem localizado ao lado da Universidade de Ottawa, do maior shopping center da cidade e a poucas quadras do seu centro histórico e principais atrativos.


E sem muitas delongas foi o tempo de deixar a pequena mala de viagem na cela e, ao contrário de um real prisioneiro, buscar a liberdade de conhecer a capital canadense em apenas um dia. E o que tenho a dizer sobre Ottawa: Bem, neste ponto prefiro deixar minha opinião neutra simplesmente porque, ao contrário do sentimento de bem estar e felicidade que sempre me acompanham nas viagens, neste dia em específico senti a cidade melancólica e um pouco sem “alma”, o que talvez tenha sido um sentimento individual momentâneo devido a dois motivos: o primeiro foi o choque ao entrar na cela e sentir a angústia real de ter que passar a noite privada de liberdade em um ambiente nada convencional e o segundo foi a notícia de que as minhas amigas não puderam embarcar para me acompanhar na viagem porque os passaportes delas foram extraviados pelo correio e não chegariam a tempo com os vistos. Desta forma, concluo que o meu estado de ânimo neste primeiro dia de viagem não ajudaram muito e o céu nublado também contribuíram para tal. De qualquer forma Ottawa é bem agradável e mais parece uma pacata cidadezinha de interior apesar de ser a capital do país e, principalmente na época em que a visitei (setembro), oferecia várias opções de entretenimento ao ar livre como espetáculos, feirinhas e restaurantes, inclusive tive a oportunidade de assistir ao espetáculo de projeção 3D no prédio do Parlamento, a troca de guarda do soldado desconhecido com direito a sinfonia de gaita de fole escosesa e provar diversas delícias da feirinha local de produtos orgânicos, o que de certa forma acabaram revigorando o brilho da viagem.


Apesar de ser a capital do país, Ottawa pode ser perfeitamente visitada em um único dia em excursões que partem de Montreal, a não ser que você seja um viajante a procura de museus ou esteja com bastante tempo disponível, no entanto vale lembrar que no verão o seu charme ainda fica por conta das atividades noturnas e do clima descontraído que surge ao pôr-do-sol quando o Parlamento fica todo iluminado e ao longo das eclusas de ByTown localizadas sobre o Rio Ottawa e que são um patrimônio nacional tombado pela Unesco.

E falando de centro histórico, é dali que partem os ônibus de turismo hop on – hop off (CAD$ 36 – passeio de 1 hora e meia) que fazem o percurso turístico passando pelo Parlamento, o Moinho de Cerveja Brew Pub, o Museu de História Natural, o Museu de Belas Artes, a Catedral de Notre-Dame, o Parque Landsdowne e a Fazenda Experimental. Durante o passeio é possível admirar a estátua da aranha de bronze ¨maman¨ no Museu de Belas Artes, uma obra do escultor Louise Bourgeois que custou ao governo canadense cerca de 10 mil dólares e representa a maternidade. Ao longo do passeio é possível também avistar as moradias em estilo arquitetônico europeu com jardins extremamente verdinhos e curados e sem nenhum sinal de grades e portões os quais pertencem aos diplomatas e funcionários públicos que vivem nos arredores do centro ao longo do Rio (Rideau).

Outro ponto bastante interessante da cidade é o Mercado ByWard que mais parece um bairro gastronômico onde é possível encontrar diversos restaurantes com uma culinária internacional variada, além de lojas de artesanato com os melhores preços da região e produtos agrícolas orgânicos fresquinhos e comercializados diretamente pelos produtores em barracas multicoloridas e aromáticas. Não deixe de experimentar os produtos à base de xarope de mapple (a resina retirada da árvore que produz a folha símbolo do Canadá que aparece também na bandeira do país) como os deliciosos crepes, donuts, cremes e caramelos.


O artesanato local também merece destaque, principalmente aqueles produzidos pelos Inuits (povos esquimós que vivem nas províncias congeladas do norte do país) como: as pinturas que representam o dia-a-dia das tribos e o habitat natural dos animais silvestres, as bolsas, sapatos e bonecos em couro, as roupas de inverno tecidas e elaboradas com couro de animais e utensílios forjados em ossos. No entanto fica a dica: é bom prestar atenção na etiqueta para não acabar comprando gato por lebre porque muitos destes produtos são Made in China e são meras cópias que não valem a pena. Vale sempre lembrar que a valorização do artesanato local deve contribuir para a comunidade que o produz, caso contrário não tem nenhuma razão de ser.

E esta história de valorizar os costumes e o artesanato local não poderia ter um desfecho mais interessante como o que ocorreu durante esta passagem em Ottawa. Depois de um dia melancólico e uma noite prevista e paga na prisão, na manhã da minha partida quando estava esperando o ônibus para ir até a rodoviária e seguir viagem para Montreal tive que pedir informações e fui prontamente iluminada por um artista Inuit chamado Norman que não só me ajudou a encontrar o ônibus como ainda se dispôs a me acompanhar até o ponto onde eu deveria descer e neste pequeno espaço de tempo conseguiu contar sua história de vida e sua luta para manter sua saúde, sua arte e seus costumes em um país moderno que acolhe o progresso e em contrapartida, como muitos tantos, segrega seus próprios cidadãos.
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